domingo, 22 de março de 2015

PEDOFILIA NA IGREJA EVANGÉLICA


O choro silencioso de crianças e famílias abusadas

Robson T. Fernandes

Uma das coisas que mais alegra o coração de um servo de Deus é poder falar das grandezas do Senhor para que as pessoas sintam suas vidas preenchidas pela bondade do Pai celestial. Mas, infelizmente esse não será o nosso caso hoje. Antes de qualquer coisa, preciso confessar que escrevo esse texto com o coração partido e lágrimas nos olhos, ao mesmo tempo em que sou tomado por um sentimento que mistura indignação, raiva, impotência, desejo de justiça e vergonha. 

Antes de começarmos é importante reafirmar que a Igreja bíblica não é representada por uma denominação religiosa e nem por uma estrutura eclesiástica, ela é formada por um povo que foi salvo pelo sacrifício do Senhor Jesus. Essa Igreja deve ser conhecida como a coluna e o baluarte da verdade (1Tm 3:15). O compromisso com a verdade deve ser a marca fundamental do povo de Deus, especialmente porque a verdade, o acesso à verdade e o conhecimento da verdade é que conduzem o povo à libertação (Jo 8:32). Se a Igreja não estiver profundamente comprometida com a verdade, ela jamais saberá o que significa liberdade em Cristo, ela jamais terá credibilidade na sociedade, nada mais valerá a pena, nada mais importará, nada terá valor porque ela viverá escravizada a uma vida de mentira. É exatamente pela falta desse entendimento que Ronald Sider afirmou que “o comportamento escandaloso tem destruído rapidamente o cristianismo [...], os cristãos afirmam com os lábios que Jesus é Senhor, mas com os atos demonstram lealdade ao dinheiro, ao sexo e a seus interesses pessoais” [1].

Diante desse chamado Sagrado, para vivermos uma vida fundamentada na verdade, somos moralmente obrigados a reconhecer, por mais que doa e por mais que machuque, que a triste verdade é que a pedofilia é uma realidade não só na igreja católica, como muitos já estão habituados a falar, mas também é uma dolorosa realidade na igreja evangélica.

Recentemente temos presenciado o aumento do número de casos de pedofilia na igreja evangélica, cometidos por aqueles que deveriam ser os guardiões da fé, os apascentadores do rebanho, os conselheiros, os intercessores, os instrutores e líderes da Igreja: os pastores.

Para termos uma noção da gravidade e da intensidade dos casos de pedofilia na igreja evangélica, mesmo que esta noção seja superficial, podemos citar alguns casos como: pastor Edison Luiz Freitas, preso por pedofilia no Pará [2]; pastor Dionísio da Silva Mattos, preso por pedofilia no Rio de Janeiro [3]; pastor Josuel Gonçalves de Souza, preso por pedofilia em Brasília [4]; pastor José Roberto Góes, preso por pedofilia em Goiás [5]; pastor Raimundo Teodoro Pereira Filho, preso por pedofilia no Maranhão [6]; pastor Sérgio Benito González Saez, preso por pedofilia em Curitiba [7]; pastor Franckmar Almeida de Souza, preso por pedofilia no Amazonas [8]; pastor Reginaldo Sena dos Santos, preso por pedofilia no Rio de Janeiro [9]; pastor Francisco Vicente Correa Filho e a esposa, Elizabeth Graff, presos por pedofilia no Paraná [10]; pastor Geraldo Pereira Nunes, preso por pedofilia em Curitiba [11]; pastor Antônio Pedroso, preso por pedofilia no Paraná [12]; pastor José Sardinha, preso por pedofilia em São Paulo [13]; pastor Vicente Pires, preso por pedofilia em Brasília [14]; pastor Alcindo Cristovão Miranda, preso por pedofilia em Porto Velho [15]; pastor Robson Gomes dos Santos, preso por pedofilia no Maranhão [16]; pastor Wilmar Martis de Barros, preso por pedofilia em Pernambuco [17]; pastor Valdivino Oliveira, preso por pedofilia no Amazonas [18]; pastor Edson Alves da Costa Filho, preso por pedofilia no Rio de Janeiro [19]; pastor Pedro Paulo Costa, preso por pedofilia no Amazonas [20]; pastor Dirlei Francisco da Silva, preso por pedofilia em Porto Alegre [21]; pastor Cleyson Alves de Souza, preso por pedofilia em Manaus [22]; pastor Edimário Gama de Freitas, preso por pedofilia na Bahia [23] etc. Muitos e muitos outros casos poderiam ser citados, inclusive alguns que incluem o acobertamento e ajuda de “fiéis” das igrejas dos pastores pedófilos e até das próprias esposas.

Para mim que sou pastor, ter que escrever sobre esse tipo de coisa é doloroso demais. É o mesmo que expor o meu nobre ofício pastoral à vergonha pública, ao triste escândalo que atravessa meu coração como uma lança. Não desejo jamais ser confundido com os monstros que praticam esse tipo de coisa abominável e muito menos desejo ser chamado de conivente ou indiferente. O divino ofício pastoral é para mim honroso, nobre e maravilhoso, e me dói profundamente ver que tem sido maculado e desacreditado por causa desses monstros, discípulos de Judas Iscariotes.

Para mim que sou pai de uma linda menina, ter que escrever sobre esse tipo de coisa é o mesmo que me confrontar publicamente com uma profunda indignação e raiva. Chego a sentir ira. Ao mesmo tempo, por causa da imundícia desses cães do inferno que estão dentro da Igreja me encontro num conflito vergonhoso como pai e pastor. Sinto vergonha porque ao mesmo tempo em que meu coração de pai me leva à ira, o meu coração de pastor me leva ao desejo de justiça da maneira correta. Lembro-me que são “bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça porque eles serão fartos” (Mt 5:6). Vem então o choque: como equilibrar corretamente esses dois sentimentos? Lembro-me de Efésios 4:26, “irai-vos, e não pequeis; não se ponha o sol sobre a vossa ira”. Então entendo que a ira deve ser controlada e a justiça deve ser buscada da maneia certa. Poupar esses lobos devoradores para evitar um escândalo não é ser espiritual, não é ter Graça e nem exercer Misericórdia, é, antes de tudo, ser covarde, omisso, cúmplice e apoiador de monstros que violentam crianças indefesas e inocentes dentro da Igreja.

Para mim que não sou advogado, promotor, desembargador, juiz e nem tenho nenhuma função na área do direito ou da justiça, ter que escrever sobre esse tipo de coisa é o mesmo que me confrontar com um profundo desejo de justiça ao mesmo tempo que me deparo com um sentimento de impotência. Porém, se a mim não cabe fazer a justiça, cabe sim a obrigação moral de conduzir tais cães à presença daqueles que o Senhor Deus constituiu como autoridades responsáveis pela execução da lei, que foi deixada para o bem do povo (Romanos 13). No Texto Sagrado de Romanos 13 encontro a ordem Divina que me faz tratar dessa questão, pelo motivo certo e da forma certa.

Todo homem esteja sujeito às autoridades superiores; porque não há autoridade que não proceda de Deus; e as autoridades que existem foram por ele instituídas.
De modo que aquele que se opõe à autoridade resiste à ordenação de Deus; e os que resistem trarão sobre si mesmos condenação.
Porque os magistrados não são para temor, quando se faz o bem, e sim quando se faz o mal. Queres tu não temer a autoridade? Faze o bem e terás louvor dela, visto que a autoridade é ministro de Deus para teu bem. Entretanto, se fizeres o mal, teme; porque não é sem motivo que ela traz a espada; pois é ministro de Deus, vingador, para castigar o que pratica o mal.
É necessário que lhe estejais sujeitos, não somente por causa do temor da punição, mas também por dever de consciência.
Por esse motivo, também pagais tributos, porque são ministros de Deus, atendendo, constantemente, a este serviço.
(Romanos 13:1-6)

Então, como teólogo, pastor, pai, homem e filho de Deus o que me resta fazer, por enquanto, é esboçar em palavras a verdade, na esperança de que esta verdade abra os olhos daqueles que têm a autoridade para agir e daqueles que foram abusados para que tenham a coragem de falar. Isso não apagará as marcas deixadas por esses monstros no passado, mas ajudará outras pessoas no presente para que não sejam abusadas por esses mesmos monstros que ainda estão soltos. Então, declaro publicamente que imagino a dor e o sofrimento daqueles que foram abusados por quem os devia proteger, e, por isso, convido os que foram abusados por falsos pastores que façam a denúncia aos órgãos públicos responsáveis. Tenham coragem e entendam que, assim como foi em muitos outros casos, assim que a primeira pessoa fizer a denúncia e esta se tornar pública, muitas outras o farão também. Então, a verdade será estabelecida, muitas outras crianças serão poupadas de passar pelo mesmo abuso e a justiça começará a ser feita.

Muito embora essa questão seja muitíssimo delicada, especialmente para mim que sou pastor, incentivo a todos que sabem de casos como esses que formalizem a denúncia, para que o mundo saiba que existem igrejas evangélicas que não comungam com esse tipo de absurdo, que ainda existem crentes fiéis ao Senhor, que ainda há um remanescente comprometido com a verdade e que, apesar da dor e da vergonha, ainda há povo de Deus sobre a face da Terra.

Com lágrimas nos olhos e uma profunda dor no coração: Robson T. Fernandes, um pastor.

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[1]. SIDER, Ronald J. O escândalo do comportamento evangélico. Viçosa: Ultimato: 2006.


























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SOBRE O AUTOR:

Robson T. Fernandes é graduado em Teologia pelo STEC e pelo IBRMEC e Mestre em Hermenêutica e Teologia do Novo Testamento pelo Betel Brasileiro. Tem se dedicado desde 1998 ao ensino e pesquisa na área de Hermenêutica, Apologética, História, Teologia e Fé e Ciência. É pastor auxiliar e líder da Secretaria de Ensino da Igreja Cristã Nova Vida. É escritor e co-autor do livro “Apostasia, Nova Ordem Mundial e Governança Global” (em co-autoria com Augustus Nicodemus Lopes, Russell Shedd, Norman Geisler, Uziel Santana e Norma Braga).

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